Monte das Oliveiras
Bebes.Comes 14/12/2014

A história de uma peça portuguesa e a história de uma oliveira milenar…


Desenvolvida por um simpático e empreendedor casal, a Rute Rosa e o Sérgio Vieira, que através do seu projecto – Laboratório d’ Estórias – cultivam a “arte de contar estórias… em forma de objectos“.  

Apaixonámo-nos por este Monte das Oliveiras, uma peça que é constituída por um prato em grês para degustação de azeite, uma taça para servir alimentos e uma tábua em madeira de Oliveira.


Um jogo entre peças que se encaixam… beleza e funcionalidade, a resultar numa das peças mais charmosas para ter à mesa que encontrámos nos últimos tempos.


Tivemos em primeira mão o privilégio de a fotografar, e agora já não sai mais de nossa casa. E melhor, pode ser vossa… quem não gosta de oferecer prendas no Natal? É só participarem no nosso passatempo Give Away de facebook  (ler as condições de participação).

O conjunto é acompanhado por uma explicação e um texto ilustrativo sobre a importância do azeite ao longo dos tempos. Retirámos um pouco dessa linda história para vos contar…

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Como cada gota veio de longe


Os homens chegam e partem, amam e matam, destroem e criam, e eu aqui. Desde tempos em que nem sequer havia homens, quando só os pássaros se vinham alimentar dos meus frutos, e os animais buscavam a minha sombra. Demorou, até primeiro se abeirar alguém, e foi uma mulher. Trazia um bebé às costas e com o peso do seu corpo puxou um ramo para baixo, gesto inaugural que muito me impressionou. Colheu um punhado de azeitonas com as suas destras mãos, e eu soube assim que havia homens sobre a terra. Longe de imaginar o que isso viria a implicar… (…)

Nunca deixaram de apreciar o sumo dos meus frutos, a pureza deste óleo, mas o culto esmoreceu. Já fui muito venerada, imaginam? (…) Os atletas gregos usavam uma coroa das minhas folhas caso se sagrassem vencedores. (…) Com a minha madeira se construíram ceptros reais, e com cada gota deste azeite milenar se ungiram monarcas e sacerdotes. (…) Na inigualável história de Noé perante o final do mundo, no livro do Génesis, uma pomba traz-lhe uma mensagem para que não se preocupe, que o mundo irá perseverar: essa mensagem é um ramo de oliveira que carrega no bico… (…) Não duvidem, que eu vim de longe, dos confins do tempo.(…) e foram os gregos que nos levaram atrás na sua expansão. (…) que nos levaram pela bacia do Mediterrâneo e mais tarde até além mar, nas caravelas, com os portugueses e com os espanhóis, até às Américas. (…)

Com tanta aventura, tenho hoje família por todo o mundo, na Argentina, Austrália, Chile, Estados Unidos da América, até ao Japão, México, China e República da África do Sul.  Trouxeram-me para Portugal nem a palavra Portugal existia na boca dos homens. Mas a terra por debaixo dos seus pés, sim. Em Sta. Iria da Azóia, que na altura nem sonhava em chamar-se assim, tenho parentescos com quase três mil anos.


Gostei dos terrenos pedregosos onde enrolar as minhas raízes, gostei do clima, da vista para o oceano. Há quem se queixe dos períodos de seca, a mim não me faz grande diferença. (…)


Adaptando-me a tudo isso, tornei-me numa personagem indispensável ao palco da agricultura portuguesa, sempre em cena. (…) Todos me acolheram, no seu dia a dia, deixando que lhes alumiasse as candeias, aos pobres, e os candelabros, aos ricos. Sou parte essencial do repasto mais frugal, tanto quanto dos grandes banquetes dos nobres. E no ritos religiosos já não prescindem de mim. (…)

Tanto progresso e tanta transformação e, afinal, o que ainda nos parece essencial é o paladar mais virgem, aquela suculência inigualável de um prato bem regado com estas preciosas gotas. Talvez sejam elas o sabor do próprio tempo. Cada uma destas gotas vem de muito longe, e traz em si toda a história do mundo: é que eu estava lá, quando Cristo rezou e morreu no Monte das Oliveiras,  estou por todo o lado nas histórias que narra a Bíblia (…)


Gota a gota, cultura a cultura, refeição a refeição.


(…) Não fui totalmente esquecida nos tempos modernos, eu e o meu poder simbólico, mas já não é como na Antiguidade… Recentemente, quando o homem posou pé na lua, o que lá deixou foi uma parte de mim. Quando o astronauta Neil Armstrong finalmente alunou, deixou lá um dos meus ramos, na tentativa de simbolizar a paz. (…)

Pinga a pinga, poema a poema, a cada banquete, a cada farnel, todas as épocas souberam apreciar as muitas dimensões do azeite: o seu sabor, as suas múltiplas funções, o seu contributo para uma dieta saudável, o seu uso nas mais variadas culturas, ao longo de todos os tempos. São preciso cinco a seis quilos dos meus frutos para se extrair um litro de azeite. Cada gota desenha ao cair o fio desta história de tempos imemoriais. A gota que cai hoje na azeiteira da mesa moderna é essencialmente a mesma que outrora caiu no repasto do homem neolítico, na pele da mulher grega que o utilizava como hidratação, na candeia do pastor que conduzia os seus rebanhos pela noite escura. (…)


Gota a gota, cultura a cultura, refeição a refeição. Cada uma destas gotas vem de longe – e sabe muito.


Estória  Joana Bértholo


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Laboratório d’Estórias

www.laboratoriodestorias.com

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